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“Existe uma falsa ideia de controle do processo. A fermentação natural sempre será um desafio irresistível”

Entrevista com Patti Dias Aguiar

A Patrícia Dias Aguiar, ou Patti, como ela prefere, mora em Rondonópolis no Mato Grosso, é veterinária apaixonada por cavalos e descobriu seu amor pelos pães vendo sua avó preparar deliciosas roscas trançadas.

Participante ativa nos fóruns nacionais e internacionais de padeiros amadores na internet, ela resolveu compartilhar um pouco da sua história com a gente.

Qual sua formação profissional?

Sou médica veterinária, apaixonada por cavalos desde menina, dos tempos que passava as férias com meus avós no interior de São Paulo. De lá também surgiu a admiração por tudo que vinha e surgia do fogão a lenha, todo de cimento queimado manchado, bem no fundo da cozinha da casa antiga, de tábuas corridas felizes e rangentes. Tudo sempre dentro do contexto de organismos vivos.

Quando e como você aprendeu a fazer pães?

A mágica do pão sempre me provocou um enfeitiçamento, quando acordava nesta casa com porão, abria a porta do forno e lá estava …já muito cedo…a rosca trançada quentinha da minha avó. E com ela aprendi as receitas mais simples, de cozinha e de vida.

Segundo o escritor francês Marcel Proust o olfato e o paladar têm o poder de convocar o passado. Ele atribuiu a uma Madeleine (bolinho de limão em forma de concha), e uma xícara de chá o fato de ter recordado de um período esquecido de sua infância. Compartilho muito desse sentimento descrito por ele, e ainda acredito que a reação inversa me ocorre muitas vezes. Há um trecho muito lindo do livro que diz “ “Mas no mesmo instante em que aquele gole, se envolve com as migalhas do bolo, tocou o meu paladar, estremeci, atento ao que se passava de extraordinário em mim”. E assim, sempre percebia em mim coisas extraordinárias, quando buscava repetir um pão doce mais próximo daquele da minha infância.

Descobri também que, aquelas sensações durante o processo de fazer o pão me faziam bem, elevavam minha alma, e que talvez fosse possível transmitir isso aos meus filhos e a quem provasse. Os pães rústicos com fermentação natural apareceram na minha vida por acaso, quando resolvi testar uma receita de pão italiano há um ano, e não consegui. Então…criei meu levain. Tentei mais uma vez, e novamente não tive êxito. Comecei a comprar livros, estudar, errar, praticar, me descabelar, surtar, treinar, chorar no chão da cozinha, buscar ajudas, ler mais, fazer amigos e, então deu certo.

Os pães rústicos e seu processo milenar enchem minha alma de história, e também remetem meus pensamentos ao passado. Nunca fiz nenhum curso de panificação.

Qual a melhor coisa de fazer pão?

Proporcionar a minha família e amigos um pão nutritivo, de boa qualidade e de sabor “complexo”. Essa partilha é energizante e gratificante. Aroma de pão quentinho enche a minha casa de vida, de novas vidas e de outras vidas.

Quais suas maiores dificuldades para fazer pão?

A temperatura alucinante da região onde moro, o tempo que preciso dividir entre o pão e o trabalho com os animais, e a falsa ideia de controle do processo. Fico taquicárdica a cada fornada. A fermentação sempre será um desafio irresistível.

Para quem você faz pão?

Faço pão pra minha família, amigos, e comercializo uma pequena produção artesanal com uma variedade de sabores e recheios que mudam semanalmente.

Com que frequência e quantos pães você costuma fazer?

Normalmente faço pães de segunda a sábado. As massas são produzidas e assadas sempre pelas manhãs, porque trabalho como veterinária à tarde. À noite preparo os recheios, soakers, autólises, e ás vezes até sovo ou asso algum pedido extra especial. Minha produção varia de 2 a 6 pães por dia.

Você trabalha com fermento natural?

Utilizo somente fermento natural nos meus pães rústicos, isso virou paixão e convicção. “Eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento.” (Antonio Gedeão, In Movimento Perpétuo, 1956).

Que farinhas você costuma utilizar?

Costumo utilizar as farinhas nacionais Venturelli e Anaconda tipo 1. Elas funcionam bem dentro do meu processo, e tenho acesso fácil onde moro.

Que forno você usa?

Utilizo o forno elétrico do fogão Brastemp Gourmand.

Algum utensílio favorito ou essencial?

Não vivo sem o despertador, sou extremamente rigorosa com os tempos do processo.

Qual sua especialidade ou receita favorita?

Meu favoritinho é o pão rústico com tâmaras, damascos, nozes, cardamomo, canela e noz moscada.

Qual seu livro que não sai da sua bancada?

Há dois livros que não saem de mim, não só da bancada. Levo pro trabalho e volto todos os dias com eles numa mochila: o “Panificação e Viennoiserie” do Michel Suas e o “Sourdough”da querida Sarah Owens.

Os incentivos e partilhas dos amigos do “universo do pão” foram e são imprescindíveis ao meu processo de aprendizado contínuo. Agradeço imensamente ao Adriano Ribeiro pela oportunidade e carinho.

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