Percebemos como o mundo da panificação tem se transformado e evoluído ao conhecer a Mariana Galhardo, uma jovem que foge do estereótipo de um padeiro tradicional.
Ela tem 26 anos, nasceu em Sorocaba (SP), é apaixonada pela fermentação natural e possui um incrível talento para a panificação artesanal. Sua padaria, a Leveda Pães Artesanais, atende encomendas particulares e estabelecimentos comerciais nas proximidades de Perdizes, bairro onde ela mora em São Paulo.
Essa é a primeira de uma série de entrevistas que faremos com padeiros profissionais e amadores. Quer participar ou indicar alguém? Entre em contato.
Qual sua formação profissional?
Minha primeira formação é em Estudos Literários, na época trabalhei como professora e tradutora de francês. Foi durante um intercâmbio na França que me apaixonei por cozinha e assim que concluí o curso, me mudei para São Paulo e fui fazer Gastronomia.
Quando e como você aprendeu a fazer pães? Fez algum curso ou frequentou alguma escola de panificação?
Tive a matéria de panificação no curso de gastronomia, mas não aprendi a fazer pão de verdade lá. Os processos eram muito rápidos, mal dava tempo de fermentar o pão, como todo o processo do início ao fim tinha que ser feito durante as 4h de aula, o resultado não era legal. Meus pães nas aulas ficavam tão feios que a chef não os considerava para dar a nota do grupo (risos). Fiquei tão frustrada que decidi fazer um curso de Fermentação Natural na Levain e de lá comecei a fazer meus testes em casa, adaptei as técnicas e receitas aprendidas no curso até chegar a um resultado que me agradasse.
Você já trabalhou em alguma padaria?
Estagiei em uma padaria na minha cidade e depois que me formei em Gastronomia fui procurar trabalho em padarias, mas a realidade das grandes produções não me agradou e resolvi fazer o pão que eu acreditava e queria comer. Pra mim só faz sentido fazer pão de verdade: orgânico, de fermentação natural, sem fermento industrializado, sem aditivos, melhoradores, corantes, produtos químicos e com fermentação longa. Criei a Leveda Pães Artesanais nessa esperança de fazer o pão que eu acreditava ser gostoso, saudável e nutritivo de verdade.
Qual a melhor coisa de fazer pão?
Lidar com um alimento vivo que a cada dia está de um jeito, esse lado incontrolável do pão de fermentação natural me fascina e me acalma, aprendi a abrir mão do controle. A melhor parte para mim é observar as variações da massa, cada passo importa na produção de pão, então qualquer diferença minúscula de tempo, temperatura ou umidade dá diferença no produto final. Sou apaixonada por essa peculiaridade, acho ilusório querer padronizar o pão pois cada dia ele se comporta de uma forma.
Quais suas maiores dificuldades para fazer pão?
Lidar com o tempo dele. Não sou eu quem mando no meu tempo de trabalho, mas o pão. Então tive bastante dificuldade em encaixar meus tempos com os dele, mas hoje nos acertamos!
Para quem você faz pão?
Faço pão para alguns lugares e pequenas encomendas particulares, a maior parte das vendas vai para o Café Dazô em Perdizes, a Maniva Store em Higienópolis e a Estela Passoni em Pinheiros. Meu público são pessoas que se importam com a procedência dos alimentos que comem, que gostam de saber que o trigo usado nos pães deles foi plantado por agricultores familiares no Paraná, que percebem a diferença no sabor e na digestão de um pão longamente fermentado, que se importam com sustentabilidade e gostam de comida de verdade. Talvez eu tenha descrito eu mesma agora, mas na minha cabeça esse é meu público (risos)
Com que frequência e quantos pães você costuma fazer?
Eu faço fornadas de segunda a sexta, depende muito das encomendas, mas minha produção varia entre 12 e 30 pães por dia. Começo a modelar os pães do dia as 6h30, alimento o levain para os pães do dia seguinte e enquanto eles crescem tenho um tempo livre para ir à academia entre as 7h30 e 9h, depois asso as fornadas até a hora que for preciso (geralmente até as 14h) e as 14h começo a preparar as massas do dia seguinte. Termino tudo por volta das 17h, quando consigo responder e-mails, preparar cursos e postar nas redes sociais.
Você trabalha com fermento natural?
Sim, apenas fermento natural. Não uso fermento biológico pois não vejo necessidade.
Que farinhas você costuma utilizar?
Depois que descobri a farinha Paullinia, não usei mais outra. Gosto muito dela, acho que para fermentação longa e natural, ela é perfeita, além de ser brasileira e orgânica. Fui conhecer as plantações e o moinho dela e fiquei apaixonada, não pretendo usar outra farinha.
Que forno você usa?
Tenho um forno semi profissional chamado Brastemp Gourmand, ele é ótimo para quem faz pão em casa como eu, mas confesso que para mim ele já está pequeno.
Algum utensílio favorito ou essencial?
Acho que meu utensílio favorito são minhas mãos, uso 3 máquinas para fazer meus pães (masseira, geladeira e forno), mas as mãos são as mais importantes pois é com elas que sinto se o pão está pedindo mais água, mais sova, mais fermentação.
Qual sua especialidade ou receita favorita?
Minha especialidade é fermentar tudo! Sou conhecida como a “louca do levain” e aceito com orgulho o título, acho que tudo que contém trigo deve ser fermentado, por isso fermento também meus bolos e biscoitos. Acho que minhas receitas favoritas são o pão integral multigrãos e o brownie fermentado que criei.
Qual seu livro preferido sobre panificação ou qual você indicaria para quem está começando?
Vou indicar um livro que mudou minha vida e não é apenas sobre pão. Se chama A Arte da Fermentação do Sandor Ellix Katz em que ele ensina como fermentar diversos alimentos como pão, queijo, legumes, carnes etc. Achei incrível pois ele é um manifesto também para as pessoas fermentarem a própria comida. A fermentação natural reflete os sabores do lugar onde o alimento é feito, por quem ele é feito e com quais ingredientes é feito, por isso ela é uma forma de negar a padronização do sabor criada pela indústria. Sou fã desse livro e recomendo para quem gosta de cozinhar no geral.
Gostaria de agradecer a oportunidade por essa entrevista e convido quem quiser conhecer mais meu trabalho entrar nas páginas da Leveda no Instagram e Facebook.
Ótima entrevista! Parabéns!!!!!!!!!!!!!!!
Valeu, Alex!